Neste ultimo sábado, 28
de maio, foi apresentado no Espaço de Cultura Sylvio Monteiro o espetáculo
teatral “A noite em que ele não veio”. A apresentação foi pelo ‘Projeto Mostra
Colisão’, que contabilizou ao todo nove espetáculos teatrais com
oficinas/debates integradas após cada espetáculo. Com um cenário muito bem
acabado, o espetáculo teve um belo repertório musical. Amariles
(Carla Nunes) estava sempre a esperar por um amor a beira mar, como na noite em
que ele, Raul (Madson Vilela), não veio, pois ali, não tinha alma. Um corpo
vazio e um amor eterno. Que o mar o traga de volta, mas se não trazer, que
junto à leve.
A história se passa
no período da ditadura militar. Pescadores presos a uma ilha e contracenando
com um protagonista essencial para o espetáculo, o mar. O grupo Nós da Baixada,
oriundo do grupo ‘Nós no Morro’ que estabeleceu em 2007 por algumas sedes na
Baixada Fluminense, encontra-se no Bairro Cerâmica – Nova Iguaçu. “A
apresentação no Colisão Teatral contabiliza a quarta apresentação do grupo, que
ainda busca uma identidade para crescer profissionalmente”, disse Anderson Dias,
diretor do espetáculo e coordenador do espaço Nós da Baixada desde 2009.
O teatro permite essa
construção coletiva, com pessoas tão jovens fazendo um trabalho teatral com
seriedade, mostrando a vontade de realmente fazer teatro. O processo de criação
do espetáculo teve duração de um ano e três meses. “Começamos pela
leitura de ‘Ponto de partida’, do dramaturgo Gianfrancesco Guarnieri,
onde a partir disso o elenco começou a pesquisar questões dramáticas desse texto para construir um objetivo”, disse Derson,
como Anderson é conhecido por todos dentro do grupo.
“Nada surge do dia pra
noite”, disse. Quebrando pedra por pedra para trabalhar com o teatro, o grupo
tenta alçar novos vôos. “Desde 2005 temos o patrocínio da petrobrás, mas se não
tivéssemos, não seria impossível criar o espetáculo, mas seria muito difícil”,
concluiu Derson. Todo o processo foi complicado, conversaram com muitas pessoas
para poder enriquecer o trabalho, relatando a questão da omissão ou a não ação
de um cidadão no meio que ele vive.
Jessica Meireles e
Marcelle Morais foram as autoras do texto. “As duas tem 80 por cento de
participação na criação da dramaturgia, mas todos foram participando do projeto
dando seus ‘pitacos’ para melhorar o processo”, contou Anderson, exemplificando
que Rômulo criou a história de seu personagem. O objetivo do espetáculo é
deixar cada espectador pensando no espetáculo e na temática que ele aborda. “Pensamos
em um espetáculo e o Derson trouxe e proposta do ‘ponto de partida’, de Guarniere,
a partir disso começamos a pensar em contar alguma coisa, passar para a
plateia, algo que fizessem vocês pensar, assim como nos fez”, disse Jessica
Meireles, que interpretou a personagem Dália.
Inicialmente foram muitos
improvisos que geraram algumas cenas ainda presentes no espetáculo. O mar, um
protagonista indispensável no espetáculo, foi tratado de forma poética como
todo o texto. “Falamos dele como outro ser humano, e a linguagem poética foi
uma coisa que fluiu de forma natural”, contou Marcelle Morais, interpretou o
Pastor. Além do tipo de linguagem abordada no espetáculo, o mesmo, rompe o
espaçamento temporal, juntando presente, passado e futuro. Uma história que relata a perda, o amor e preenche o tablado de mistérios.
Comentários principais
sobre o processo de criação e o sentimentalismo, dos mesmos, em relação ao
texto:
Ainon, pai de Raul (Thiago Zandonai) – “Quando o texto veio, achamos muito bacana e pesquisamos em todo seu
entorno, o que acabou gerando uma bola de neve que a cada dia aumentava mais. Não
gosto de personagens dramáticos, pois é uma deficiência minha, mas como ator eu
tive que encarar e buscar o que eu tenho de melhor. Senti uma coisa tão paterna
e comecei a me colocar no corpo dos parentes que perderam partes de sua família
no período da ditadura militar. Fui me envolvendo tanto com meu personagem que
coloquei o Raul como se fosse meu filho e eu estivesse sentindo aquela dor.
Naquele momento eu ganhei o personagem, ou ele me ganhou”.
Raul (Madson Vilela) – “Para
mim, o processo teve início logo quando o Anderson trouxe o texto e começamos a
pesquisar tudo, e naquele momento uma coisa me instigou, e ainda é o que mais
me instiga ate hoje. ‘Quem eram as pessoas que lutavam pela liberdade e davam a
vida pela liberdade do povo? ’, essa era a questão. Até hoje eu pesquiso e
minha busca é saber isso, como era essa coisa de peitar o poder, do por que o
povo não tinha voz ativa. Meu trabalho é continuo e ainda não consegui
finalizar meu personagem”.
Dália (Jessica Meireles) –
“Para mim, em relação ao texto, quando começou o processo era muito distante,
mas a questão da omissão presente no texto me ganhou e foi sobre isso que eu
queria falar. Fui me deparando com omissões de todas as formas presentes na
nossa vida, não só a omissão que existe no texto de Guarniere, mas sim, a
omissão do amor, de perda. Percebi a covardia do Pastor em não contar o que ele
sabe, e percebi o quanto ele foi covarde, porém voltei meu olhar para mim, e
percebi o quanto eu sou covarde também. Questionei de que maneira, no momento
que eu me calo, eu não dou mais poder aquela mão que bate”.
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